segunda-feira, 2 de julho de 2012

PARA WOODY, COM AMOR

Poucas coisas na vida me dão tanto prazer como assistir a um filme de Woody Allen. Vocês se lembram da Rosa Púrpura do Cairo, em que a personagem saía da tela e vinha conversar com o espectador? Pois é, eu tenho vontade de fazer o percurso inverso: sair da cadeira, entrar na tela e fazer parte da história. Perdão aos que o acham um chato, melancólico e fóbico e não conseguem enxergar que, exatamente por ele se enquadrar nessas duas categorias, é que a sua genialidade é maior ainda. Ao usar todas as suas “doenças” e transformá-las em obras-primas, Woody consegue fazer o que muitas vezes a própria análise não consegue: tornar risíveis as tragédias que nos constituem. Seu pavor pela morte, suas paranóias, suas manias e obsessões, suas fragilidades e inseguranças, são a matéria-prima de seu fazer artístico. Woody humaniza o ridículo que muitas vezes fazemos questão de esconder. Os seus muitos anos de análise e de vida fizeram dele um ser sábio, que conhece os meandros e as complexidades da alma. Tudo parece tão verdadeiro e simples,como ele demonstra através de um personagem de seu último filme,um cantor de óperas de chuveiro, que só consegue sê-lo nessas condições.Fora desse cenário, a magnitude de sua voz se perde. O que parece impossível de ser conciliado, num passe de mágica é resolvido. Basta levar o chuveiro para o palco. Perfeito. Que metáfora linda do que é o cinema. Nele, o imaginário pode tudo o que a realidade inviabiliza. Essa a grande arte que nos abstrai de tudo que nos cerca no real. Tenho dívidas incomensuráveis com Woody. Ele já me retirou de momentos dificílimos, ao me capturar com os olhos e os ouvidos, perdida de mim mesma horas a fio. Sim, porque quando um filme dele vai entrar em cartaz, curto o antes, o durante e o depois. Sem contar que ainda nos transporta, pelo valor do ingresso, para Manhattan, Barcelona,Paris e agora Roma, fazendo-nos passear pelos lugares mais incríveis como se lá estivéssemos e fossemos íntimos daqueles personagens que ele cria. Com alguns minutos de sessão, parece que já nos conhecemos a tempos, tão próximos ficamos do que se passa na tela. Todas as situações nos parecem familiares, pelo naturalismo que ele imprime às histórias narradas, que nos remetem ao mais simples e banal dos cotidianos. Que atire a primeira pedra quem nunca se assustou com uma turbulência, quem nunca cantou no banheiro, quem nunca teve medo da morte. E ele ainda se apossa de sua nostalgia e nos faz atravessar o tempo, entrando num carro em Paris e indo a uma festa com Hemingway, Fitzgerald, Picasso e outros companheiros da mesma estatura. Assim ele o fez em “Meia-noite em Paris”. Em “Hannah e suas irmãs”,um Michael Caine fantástico encarna um homem casado apaixonado pela cunhada, fazendo-nos experimentar todas as sensações pueris que só um apaixonado pode viver. Agora, em “Para Roma, com amor”, embalados por “Volare”, viajamos pela cidade eterna com a mistura entre ficção e realidade que a contemporaneidade imprime às relações amorosas ou meramente sociais.O que é verdadeiro e o que é falso? Nessa transitoriedade em que as pessoas se encontram, o que vem de dentro e o que vem de fora? Na Roma dos paparazzos , ninguém escapa de dizer o que comeu , aonde e o que fez depois. Isso é de suma importância na auto-gozação hilária que Woody faz de seus próprios pavores. Não esquecendo as inspirações advindas de sua paixão por Bergman, revelada em “Interiores”,” A outra”,etc.... Aliás, misturado ao seu lado cômico,lá está o sensível na perspicácia do olhar observador-artístico sobre a vida, as pessoas e a cultura de cada lugar. Ele é literalmente Zelig , ao captar as nuances e tranportá-las para as telas.E o que dizer das trilhas sonoras? São proustianas, nos levando a outras temporalidades, nos fazendo querer dançar até morrer. Opa!!! Woody mudaria de assunto correndo...
Uma amiga de São Paulo me ligou agora falando que a crítica de lá achou que o filme deixa a desejar.
Woody, acredite, não foi o meu caso, que, aliás, é de amor assumido. O que já ri desse mundo medíocre através da sua inteligência, não há como ser pago.
I love you. Thanks a lot! Come to Rio!

Um comentário:

Angela Villela disse...

Olá, Martha:
Surpresa a essas horas da noite....Postado em 2/julho, no meu blog prosafreudiana.blogspot.com, meu artigo se encontra com o seu, publicado, ontem, dia 14. Fiquei tão orgulhosa e impressionada pela coincidência e também pela admiração que tenho por seus escritos....E principalmente, pelo amor que nos une a ele.....
E ainda no último parágrafo, vc fala das gorduras desnecessárias, tema de um curso que vou dar em agosto no espaço Gestos, no Jardim Botãnico.Estamos em sincronicidade.
Abração,
Angela Villela