terça-feira, 3 de maio de 2016

A IMPLOSÃO DA MENTIRA

    Mentiram-me. mentiram~me ontem
    e hoje mentem novamente. Mentem 
    de corpo e alma, completamente
    E mentem de maneira tão pungente
    Que acho que mentem sinceramente
    Mentem ,sobretudo, impune/mente
    não mentem tristes. Alegremente
    mentem. Mentem tão nacional/mente
    que acham que mentindo história afora
    vão enganar a morte eterna/mente.
    Mentem. Mentem e calam. Mas suas frases   
    falam.. E desfilam de tal modo nuas
    que mesmo um cego pode ver
    a verdade em trapos pelas ruas .
    ......................................................................
    mentem caricatural
    mente
    mentem como a careca
    mente ao pente
    mentem como a carroça
    à besta em frente
    mentem como a doença ao doente,
    mentem clara/mente
    como o espelho transparente.
    mentem deslavada/mente 
    como nenhuma lavadeira mente
    ao ver a nódoa sobre o linho. Mentem
    com a cara limpa e nas mãos 
    o sangue quente. Mentem
    ardente/mente como um doente
    nos seus instantes de febre. Mentem
    fabulosa/mente como o caçador que quer passar
    gato por lebre. E nessa trilha de mentira
    a caça é que caça o caçador
    com a armadilha.  

Esses são apenas alguns estilhaços de um poema  maior de Affonso Romano de Sant'Anna,  escrito anos atrás na época da ditadura.
Encontro poucas coisas que acertem o alvo tão em cheio.
O  poema e o poeta estão mais vivos do que nunca.                      
O resto é... silêncio ( Hamlet)